Operação Caronte apura suspeitas de irregularidades em atividades oferecidas por quatro empresas na cidade
A denúncia apresentada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) aponta ao menos cinco irregularidades (confira os tópicos abaixo). Em geral, as suspeitas envolvem os crimes de organização criminosa, fraude em licitação e contratos públicos e corrupção.
Os serviços funerários de Criciúma foram repassados à iniciativa privada por uma lei de 2021, por meio de uma concessão de cinco anos aberta em 2022. As regras para o serviço foram definidas em um decreto assinado em setembro de 2023. As investigações envolvem supostas interferências de empresas do ramo na elaboração do edital de licitação e na alteração das regras e preços para os serviços.
As principais acusações contra o prefeito Clésio Salvaro são as participações dele em reuniões que definiam regras para a concessão do serviço. As agendas são relatadas em um grupo de empresários do ramo funerário que buscavam intermediadores para tentar criar vantagens e boas condições para operar o serviço. Os projetos de lei e decretos que definiram as normas do serviço funerário também são assinados por ele.
Para o MPSC, o prefeito “teria, teoricamente, utilizado de seu cargo político para atuar em benefício da organização criminosa”. A decisão que autorizou a prisão preventiva do prefeito também cita indícios de que ele e outros investigados tenham sido “previamente comunicados a respeito das investigações” por um dos alvos da operação, o que representaria um risco de possível interferência.
Além do prefeito, o núcleo político do grupo investigado teria ainda a ex-gerente da Secretaria de Assistência Social de Criciúma, Juliane Abel Barchinski, e o advogado da prefeitura, lotado também na Secretaria de Assistência Social, Juliano da Silva Deolindo. O secretário da mesma pasta, Bruno Ferreira, também é citado na denúncia como membro do núcleo público com atuação para supostamente favorecer as empresas.
Diminuição de empresas no serviço
Uma das acusações feitas pelo MPSC é de que a prefeitura de Criciúma teria diminuído o número de empresas responsáveis por explorar o serviço funerário da cidade, de seis para quatro. A mudança teria o intuito de favorecer empresas específicas e foi feita por meio de uma alteração na lei municipal, em junho de 2022.
Participação de empresas em “bloco”
Uma das principais acusações da investigação é que empresas do ramo funerário teriam se unido para participar “em bloco” da licitação aberta para a concessão do serviço em Criciúma.
Segundo o MPSC, as quatro empresas que foram declaradas vencedoras da licitação teriam apresentado também documentos de outras empresas ligadas a familiares e pessoas próximas. Entre os sinais estariam e-mails e telefones iguais informados na documentação enviada. Outro indício seria também o uso de logomarcas de empresas que não venceram a licitação em carros e materiais na central funerária, mesmo não sendo as concessionárias do serviço.
Ainda confirme a denúncia, a intenção seria combinar preços e simular uma concorrência, “frustrando o caráter competitivo do certame”. A licitação foi vencida pelas empresas Frasseto Serviços Funerários, Gilberto Machado Júnior Serviços Funerários, Funerária Recanto da Paz e Serviços Funerários Bom Jesus. Em conjunto, elas são responsáveis por administrar a Central Funerária do município e têm serviços contratados por um sistema de rodízio.
Manipulação das regras do serviço
Outro ponto citado na investigação do MPSC que levou à prisão preventiva dos alvos nesta terça-feira (3) seria a atuação dos empresários e de intermediários acionados por eles na manipulação de regras para prestação dos serviços funerários na cidade.
Uma minuta do decreto que iria determinar as regras para a terceirização do serviço funerário, incluindo a tabela de preços cobrados, teria sido enviada para pessoas ligadas às empresas antes de ser concluída e publicada, em 2022.
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Em uma conversa em um grupo de aplicativo de mensagens, o sócio de uma empresa funerária teria proposto ao dono de outra que antes de assumir o serviço seria necessário “elevar esses preços, tá muito barato”.
Segundo o MPSC, os preços cobrados aumentaram em média 76% nos três primeiros meses após o funcionamento da central funerária.
A tentativa de alterar as regras teria continuado mesmo após as empresas assumirem os serviços. Um exemplo seria um pedido para alterar os termos da licitação que obrigavam os carros que transportam os corpos a serem das cores preta ou prata. “No edital fala que o carro para transportar cadáver tem que ser preto ou prata e o carro que foi comprado é branco”. Esse pedido teria ocorrido em janeiro deste ano, já após a primeira fase da operação que investiga as supostas irregularidades no serviço da cidade.
Redução da qualidade de materiais usados
Outra situação investigada pelo MPSC é a suposta redução da qualidade dos materiais usados, incluindo caixões. Segundo os investigadores, isso visaria maximizar os lucros das empresas.
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Em um áudio, o representante de uma das empresas teria informado outro empresário que colocaria urnas que seriam “boas pra Criciúma porque são feias, desmerecem o serviço e inibem o cliente de querer comprar”. Segundo os investigadores, ele pretendia utilizar o produto mesmo sem atender às especificações do edital porque “uma urna mais simples ajudaria a vender outra melhor”.
Um caso citado na denúncia envolve uma polêmica levantada na Câmara de Vereadores de Criciúma, em outubro do ano passado. Trata-se do caso de um caixão com marcas de uso que teria sido utilizado para um sepultamento.
Após a repercussão do caso, um secretário do governo de Clésio teria admitido para um intermediário que iria resolver “umas broncas” sobre o uso de um caixão de criança em péssimo estado de conservação. “Pelo que mostraram ali foi usado um caixão feio. Parece que tava… que caiu da mudança”, afirmou, segundo a denúncia do MPSC.
Contrapontos
Clésio Salvaro: O prefeito divulgou um vídeo que, aparentemente, foi gravado pouco antes de ele ser conduzido para Itajaí, onde deve ficar detido. Entre outras coisas, disse ele: “não há nada que possa me incriminar”. Ele ainda relatou que a regularização dos serviços funerários era um dos principais projetos dele na prefeitura.
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Gilberto Machado Junior e Luiz Cavalli: Ambos são defendidos pelo escritório Ferreira & Schaefer Martins Advogados. O advogado Francisco Ferreira diz que ainda não teve acesso à decisão, mas que pelos fatos iniciais entende que não há contemporaneidade, o que não justificaria as prisões.
Fábio Leier e Guilherme Mendonça: São defendidos pelo advogado Hélio Brasil. Ele alega que não há fatos novos que motivariam a prisão, e que já há denúncia da primeira fase sem que houvesse mudanças no cenário da investigação.
Eduardo D’Avila: é defendido por William Shinzanto, que foi procurado pela reportagem, mas não atendeu à ligação.
Helio da Rosa Monteiro e Henrique Monteiro: São defendidos por Marco Antonio Colombo Zapellini, que disse que não vai se manifestar antes de se inteirar sobre a investigação.
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Juliano da Silva Deolindo: o advogado dele é Thalys Ricardo Batista. O defensor não irá se manifestar por enquanto e está lendo a decisão.
Juliane Abel Barchinski: a defesa dela não foi localizada e o espaço segue aberto.
fonte NSC
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