Alvo de sanções do Ocidente pela guerra na Ucrânia, a Rússia busca contornar a plataforma internacional de pagamentos e ampliar a cooperação com o ‘Sul Global’
“Quanto mais vivermos e trabalharmos de acordo com as regras estrangeiras, em plataformas estrangerias, mais longa será essa transição”, declarou Vladimir Putin ao defender a maior cooperação econômica no bloco dos emergentes.
Moscou tem buscado alternativas para contornar Swift, sistema internacional de pagamentos, que excluiu bancos russos após a invasão da Ucrânia. Nas palavras de Putin, a iniciativa ajudaria a proteger os mercados de interferências externas, além de garantir indicadores de preços mais previsíveis.
A desdolarização conta com o apoio de outros países do Brics, como Brasil, mas a criação de uma plataforma alternativa de pagamentos praticamente não avançou. O presidente Lula, que cancelou a viagem a Kazan após bater a cabeça no banheiro, e gravou mensagem por vídeo para a Cúpula, insistiu que a discussão não pode ser adiada.
“Agora é chegada a hora de avançar na criação de meios de pagamento alternativos para transações entre nossos países. Não se trata de substituir nossas moedas. Mas é preciso trabalhar para que a ordem multipolar que almejamos se reflita no sistema financeiro internacional”, defendeu Lula.
Além de insistir em alternativas ao sistema financeiro internacional, a Rússia propôs a criação de uma plataforma para facilitar os investimentos entre os países do Brics. “Seria uma ferramenta poderosa para apoiar nossas economias nacionais e também forneceria recursos financeiros aos países do Sul Global”, declarou Putin.
Em seu discurso, o presidente russo disse ainda que o crescimento o Brics deve crescer acima da média global em 2024 e que o papel do bloco como liderança econômica tende a ser fortalecer.
Com a guerra prolongada, a Rússia conta com o grupo para contornar o isolamento econômico e diplomático imposto pelos aliados da Ucrânia no Ocidente. E a Cúpula em Kazan se tornou a principal plataforma internacional para Vladimir Putin, que está com as viagens limitadas pela ordem de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI).
O encontro deve terminar com a criação da categoria de países parceiros. Será mais uma expansão do bloco que era composto por Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul até o ano passado, quando decidiu pela adesão de Etiópia, Irã, Egito e Emirados Árabes Unidos.
A Venezuela era candidata e entrar como parceira, mas enfrentou resistência do Brasil e deve ficar de fora da lista, mesmo com a aparição surpresa de Nicolás Maduro em Kazan, sede da Cúpula.
Putin exibe cédula simbólica do BRICS – mas moeda conjunta ainda é improvável
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, recebeu uma espécie de cédula comum do BRICS durante a cúpula do grupo, em Kazan, nesta quarta-feira 23. A nota traz as bandeiras dos cinco primeiros integrantes do bloco: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Segundo a agência russa Sputnik, houve um debate a portas fechadas nesta quinta sobre a criação de uma moeda comum. Seria um resultado radical do que Putin define como “nova ordem mundial multipolar”, embora a concretização desta moeda, por ora, seja altamente improvável.
Foto: Reprodução/Sputnik
Quase 20 chefes de Estado ou de governo, incluindo os de China, Índia, Turquia e Irã, se reúnem nesta semana na Rússia para discutir temas mais concretos, como o desenvolvimento de um sistema de pagamento internacional liderado pelos Brics.
Em um discurso por videoconferência, o presidente Lula (PT) afirmou ter chegado a hora de “avançar na criação de meios de pagamento alternativos para transações entre nossos países”.
O petista enfatizou não se tratar de uma substituição das moedas nacionais, embora avalie ser necessário “trabalhar para que a ordem multipolar que almejamos se reflita no sistema financeiro internacional”.
“Essa discussão precisa ser enfrentada com seriedade, cautela e solidez técnica, mas não pode ser mais adiada.”
Presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento, conhecido como Banco do BRICS, Dilma Rousseff também defendeu um incremento nos financiamentos em moedas nacionais, em substituição ao dólar.
“Tivemos investimentos bastante elevados, mas ainda não o suficiente para as necessidades dos países do BRICS”, argumentou a ex-presidenta da República. “Por isso, é muito importante disponibilizar financiamento em moeda local através de plataformas específicas.”
As ideias são diferentes: turbinar as negociações em moedas nacionais, reduzindo o peso do dólar, é uma solução muito menos extrema do que a eventual criação de uma moeda comum entre os integrantes do bloco.
Em linha com Dilma, Putin declarou que ampliar os pagamentos em moedas locais permite reduzir as taxas de serviço das dívidas, aumentar a independência financeira dos países do BRICS, minimizar os riscos geopolíticos e “libertar o desenvolvimento econômico da política”.
Percebe-se, portanto, não haver uma articulação de fato por uma moeda comum, uma vez que não há condições práticas para uma empreitada de tamanha magnitude.
A rigor, a própria tática de desdolarizar a econômica encontra reações diferentes no BRICS. Para Putin, porém, há questões sensíveis envolvidas, especialmente com o aumento dramático das sanções impostas a Moscou desde a invasão da Ucrânia, em fevereiro de 2022.
A Rússia trabalha, por exemplo, para viabilizar uma infraestrutura de liquidação e pagamento que contornaria o sistema Swift, baseado na Bélgica.
Swift é a sigla para Sociedade de Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais. Trata-se de um modelo criado por bancos em 1973 para permitir a troca de moeda entre diferentes países com rapidez e segurança.
Dias após deflagrar a ofensiva contra a Ucrânia, a Rússia foi excluída do sistema. Por isso, criar uma alternativa ao Swift para facilitar transações financeiras internacionais seria importante para Putin, diminuindo a dependência de infraestruturas controladas pelo Ocidente. Significaria, em suma, um novo instrumento para resistir a pressões externas.
Segundo Putin, uma plataforma para driblar o Swift e as sanções seria “um poderoso instrumento de apoio às economias do BRICS”. Funcionaria, de quebra, para “prover recursos financeiros aos países do Sul e Leste Global”.
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