Tema tomou conta do debate público no último final de semana após a apresentação de um projeto da deputada Erika Hilton (PSOL) que pretende reduzir a jornada de trabalho no País sem corte salarial
Um movimento nas redes sociais que pede o fim da escala de trabalho 6×1, em que os trabalhadores têm apenas um dia de descanso após seis dias consecutivos de jornada, ganhou força nos últimos dias. A campanha online, liderada inicialmente pelo vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ), já angariou mais de 1,4 milhão de assinaturas. No âmbito nacional, um projeto de lei para acabar com o modelo de jornada é assinado pela deputada Erika Hilton (PSOL).
No Brasil, a escala de trabalho 6×1 está fundamentada na legislação trabalhista, especificamente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foi criada em 1º de maio de 1943. A escala em si não foi exatamente “criada” em uma data específica, mas se consolidou como prática baseada nas disposições da CLT, que regulamentam a jornada de trabalho e os períodos de descanso, sem citar nominalmente o modelo 6×1.
Quando a CLT foi instituída durante o governo de Getúlio Vargas, a ideia era garantir direitos mínimos aos trabalhadores, como a jornada semanal máxima de 44 horas, o repouso semanal remunerado e outras proteções, em um período marcado por pouca regulamentação e condições de trabalho precárias no Brasil.
Desde 1943, a escala 6×1 se tornou uma prática comum, sobretudo em empresas que precisam operar todos os dias da semana. Embora a Reforma Trabalhista de 2017 tenha introduzido várias mudanças na CLT, a escala 6×1 foi mantida, pois é vista por empresas como uma forma de conciliar a carga horária semanal de 44 horas com o direito ao descanso semanal remunerado.
Como funciona a escala 6×1?
Pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a jornada semanal padrão no Brasil é de 44 horas, com um limite diário de 8 horas de trabalho, podendo ser estendida por até 2 horas extras mediante acordo. No caso da escala 6×1, a carga horária é distribuída ao longo de seis dias em duas possibilidades:
- 7 horas e 20 minutos por dia para cumprir as 44 horas semanais, ou
- 8 horas diárias, com compensação em um dia mais curto ou outro ajuste acordado entre empregador e empregado.
Nesse modelo de trabalho, o funcionário tem direito a apenas um dia de folga por semana, que deve, preferencialmente, coincidir com o domingo. Na realidade, porém, nem sempre isso acontece. Em setores que funcionam todos os dias, como o comércio e a hospitalidade, é comum que o descanso seja jogado para dias de semana. A lei, como citado, permite tal manobra, desde que respeitado o descanso mínimo de 24 horas consecutivas.
Mudança legislativa?
A proposta de acabar com o fim dessa modalidade de jornada foi abraçada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL), que tenta, nas últimas semanas, angariar apoio para uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que visa a redução da carga horária semanal de 44 para 36 horas, distribuídas em quatro dias de trabalho (uma escala de 4×3), sem que haja um corte salarial.
A deputada Erika Hilton argumenta que o modelo atual, em vigor há 81 anos, é prejudicial à saúde mental e física dos trabalhadores, afetando sua qualidade de vida e produtividade. A ideia é reformar o artigo 7º da Constituição para garantir uma jornada mais flexível e menos extenuante, em linha com a tendência global de redução de horas de trabalho.
Especialistas apontam que a escala de trabalho 6×1 é uma das principais causas de exaustão física e mental dos trabalhadores. A carga horária ainda afeta negativamente a qualidade de vida dos empregados, comprometendo, além da saúde, o bem-estar e as relações familiares.
Para que a PEC avance, Hilton precisa da assinatura de pelo menos 171 deputados, número que ainda não foi alcançado. Sem o número mínimo, a proposta não pode ser formalmente apresentada para discussão na Câmara.
A assessoria da parlamentar promete, para as próximas horas, divulgar uma espécie de balanço das assinaturas, mas sinaliza que o volume de apoiadores entre os parlamentares cresceu significativamente nas últimas horas, motivado pela pressão nas redes sociais – no domingo 10, a cobrança pelo fim da jornada 6×1 chegou ao topo dos assuntos mais comentados do X, antigo Twitter.
Apesar do apoio popular, a proposta enfrenta resistência de setores conservadores e neoliberais, que argumentam que a redução da jornada seria prejudicial à economia. No entanto, Erika Hilton, autora da proposta, rebate e aponta que o modelo 6×1 é contraproducente para o País. Os exemplos, defende, são internacionais.
“A escala 6×1 rebaixa a produtividade do Brasil, enquanto países como Reino Unido, Alemanha e Portugal, que adotaram jornadas mais curtas, mostram benefícios tanto para empresas quanto para trabalhadores”, afirmou.
Um estudo realizado no Reino Unido, que implementou a jornada de quatro dias por semana, demonstrou, por exemplo, que quase 40% dos trabalhadores sentiram menos estresse e mais de 70% apresentaram redução de sintomas de burnout. Além disso, empresas reportaram menor rotatividade de funcionários e um ligeiro aumento na receita.
O estudo citado pela parlamentar para defender a proposta foi conduzido pela organização 4 Day Week Global, pelo think tank Autonomy, pela 4 Day Week UK Campaign e por pesquisadores das universidades de Cambridge, de Boston e de Oxford.
Caso a proposta consiga as assinaturas necessárias, o tema seguirá para a tramitação formal, podendo abrir um novo capítulo na história das relações trabalhistas no Brasil.
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