Operação para capturar Alexandre de Moraes foi orçada em R$ 100 mil e acabou cancelada de última hora
Pelo menos seis pessoas chegaram a sair às ruas de Brasília para colocar em prática sequestro de ministro do STF, segundo investigações da PF divulgadas nesta terça-feira
O plano de sequestrar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes não se limitou a discussões secretas e minutas clandestinas, mas ganhou as ruas e por pouco não se concretizou na captura do magistrado em uma noite de dezembro de 2022.
Detalhes da tramoia golpista presentes na decisão judicial que levou à realização da Operação Contragolpe da Polícia Federal, nesta terça-feira (19), revelam que pelo menos seis pessoas saíram às ruas de Brasília em 15 de dezembro com a intenção de monitorar e sequestrar Moraes.
A operação, batizada de Copa 2022, foi orçada em cerca de R$ 100 mil e acabou cancelada de última hora de acordo com mensagens trocadas entre os envolvidos e interceptadas pela investigação.
Um relato das apurações da PF incluído no despacho de Moraes que levou à prisão de quatro militares e de um policial federal diz: "pelo que se obteve, as ações desse grupo tiveram seu ápice no dia 15 de dezembro de 2022, data em que, possivelmente, seria realizada a prisão/execução do ministro Alexandre de Moraes na cidade de Brasília/DF. O evento clandestino executado nessa data foi identificado em razão de diálogos que estavam armazenados no aplicativo de mensagens Signal, instalado no aparelho celular de Rafael de Oliveira" (militar com formação em Forças Especiais).
O despacho prossegue: "as mensagens trocadas entre os integrantes do grupo ‘Copa 2022’ demonstram que os investigados estavam em campo, divididos em locais específicos para, possivelmente, executar ações com o objetivo de prender o Ministro Alexandre de Moraes".
A maior parte dos envolvidos utilizou denominações de países como codinome para manter contato via aplicativo. Entre eles, havia "Brasil", "Gana", "Áustria" e "Argentina2". Outros dois usaram os nomes "Diogo Bast" (identificado como Rafael de Oliveira, militar das Forças Especiais preso nesta terça-feira) e "Teixeiralafaiete230".
Às 20h33min, a pessoa associada à alcunha "Brasil" informa um dos locais em que estava posicionado um dos participantes da ação: "estacionamento em frente ao Gibão carne de sol" (um restaurante). Em seguida, "Gana" informa que se encontrava em um local combinado previamente: "Tô na posição".
Na sequência, "Brasil" pergunta ao grupo: "Qual a conduta?" — um possível questionamento em relação a como agir em relação ao ministro. A resposta de "Teixeiralafaiete230" é para aguardar.
Depois de mais alguns contatos, às 20h59min, o usuário "Áustria" diz "Tô perto da posição. Vai cancelar o jogo?." Segundo a PF, o questionamento é se a ação de captura de Moraes estava mantida ou seria abortada. Cerca de dois minutos depois, "Teixeiralafaiete230" responde: "Abortar...Áustria, volta para local de desembarque". Não fica claro, no despacho, o motivo da suspensão do plano de sequestrar o ministro. O recuo ocorreu logo depois de ter sido postada no grupo a informação de que uma votação em curso no STF, envolvendo a legalidade do chamado "orçamento secreto", ter sido adiada para a semana seguinte. Com isso, a sessão seria encerrada ainda no começo da noite.
A operação já vinha sendo idealizada desde o mês anterior. Segundo as apurações da PF, em 14 de novembro, o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, Mauro Cid, pergunta ao major Rafael Martins de Oliveira se há novidades envolvendo a trama golpista.
Oliveira responde, por mensagem: "Vibração máxima! Recurso zero!!". Mauro Cid então pergunta qual a "estimativa de gastos" envolvendo hospedagem em "hotel, alimentação e material".
No dia seguinte, Oliveira encaminha um arquivo chamado Copa 2022 com uma estimativa dos custos para a operação a ser desenvolvida ao longo daquele mês e de dezembro, confirmando a cifra aproximada de R$ 100 mil. O valor também serviria para trazer pessoas do Rio de Janeiro para reforçar a operação ilegal.
Veja, a seguir, outros trechos do despacho que levou à prisão de cinco suspeitos nesta terça-feira.
Bolsonaro teria ajustado "minuta do golpe"
"A análise e alterações realizadas pelo então Presidente da República Jair Messias Bolsonaro na denominada 'minuta do golpe' são apontadas pela Polícia Federal (...). Mensagens encaminhadas por Mauro Cid para o General Freire Gomes, então Comandante do Exército, sinalizaram que o então Presidente Jair Messsias Bolsonaro estava redigindo e ajustando a minuta do ilegal Decreto golpista e já buscando o respaldo do General Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira, tudo a demonstrar que atos executórios para um golpe de Estado estavam em andamento."
Mensagem enviada por Mauro Cid ao General Freire Gomes:
“Boa tarde, General! Só para atualizar o senhor que vem acontecendo é o seguinte. O presidente tem recebido várias pressões para tomar uma medida mais, mais pesada onde ele vai, obviamente, utilizando as forças, né? Mas ele sabe, ele ainda continua com aquela ideia que ele saiu da última reunião, mas a pressão que ele recebe é de todo mundo. Ele está ... É cara do agro. São alguns deputados, né? É né ... Então é a pressão que ele tem recebido é muito grande. É hoje o que que ele fez hoje de manhã? Ele enxugou o decreto né? Aqueles considerandos que o senhor viu e enxugou o decreto, fez um decreto muito mais, é, resumido, né?"
Moraes passou a ser monitorado após reunião secreta na casa de Braga Netto
“Conforme já relatado pela investigação, no dia 12 de novembro de 2022, o tenente-coronel Mauro Cesar Cid, o Major Rafael de Oliveira e o Tenente-Coronel Ferreira Lima se reuniram na residência do General Walter Souza Braga Netto (…). Considerando o contexto apurado, levando-se em conta informações disponíveis, o Ministro Alexandre de Moraes estava sendo monitorado, pelo menos, desde novembro de 2022. As atividades anteriores ao evento do dia 15 de dezembro de 2022 indicam que esse monitoramento teve início, temporalmente, logo após a reunião realizada na residência de Walter Braga Netto, no dia 12 de novembro de 2022."
Moraes era tratado como "professora" em trocas de mensagens
"No dia 21/12/2022, Mauro Cid, utilizando o codinome ‘professora’, para não explicitar o nome do Ministro Alexandre de Moraes, pergunta para Marcelo Camara (coronel do Exército, ex-assessor de Bolsonaro) ‘Por onde anda a Professora?’. Marcelo Camara diz: ‘Informação que foi para uma escola em SP. Ontem’. Em seguida, Mauro Cid pergunta se haveria previsão de retorno do Ministro, possivelmente para Brasília.(...) Na manhã do dia 22/12/2022, Marcelo Camara, novamente demonstrando o cuidado em não evidenciar quem estavam monitorando responde de forma figurada: ‘Somente para início do ano letivo. Apesar ter a previsão do período de recuperação. Tem dúvida’."
Braga Netto e Augusto Heleno chefiariam gabinete de crise
A PF identificou, em uma minuta, a previsão "de instituição de um Gabinete de Crise, que seria criado no dia 16/12/2022, após o golpe de Estado, composto em sua maioria por militares, sob o comando dos generais Augusto Heleno e Braga Netto, contando ainda com a participação do general Mario Fernandes e de Filipe Martins (ex-assessor para assuntos internacionais de Bolsonaro). Por fim, dentre as capacidades críticas, o documento explicita o objetivo almejado pela organização criminosa: ‘realizar a segurança e participar da coordenação e fiscalização de novo pleito eleitoral’, após as investigações de todo o pleito eleitoral."
Apresentação da minuta do golpe ao comando das Forças
“No dia 07 de dezembro de 2022, tendo ciência de que estava ocorrendo naquele momento a reunião entre o então presidente Jair Bolsonaro com os comandantes do Exército e da Marinha, além do ministro da Defesa para apresentação da minuta do golpe de Estado, com os ‘considerandos’ sendo apresentados por Filipe Martins, Mario Fernandes encaminha um áudio solicitando que Mauro Cid mostre um vídeo para o Comandante. Pelo contexto, infere-se que se trata de vídeo com conteúdo antidemocrático com a finalidade de convencer o Comandante do Exército, General Freire Gomes, a aderir ao Golpe de Estado. (…) No dia 08 de dezembro de 2022, Mario Fernandes indica ter conversado pessoalmente com o então Presidente Jair Bolsonaro. Além disso, mostra grande preocupação com os movimentos antidemocráticos que estavam nas ruas, principalmente com a possibilidade de perder o controle sobre a massa de pessoas envolvidas nas manifestações. No mais, indica que o Golpe pode restar frustrado, caso muito tempo seja esperado, pois, a partir do dia 20 de dezembro, o Comando Militar seria ‘passado’ para militares indicados pelo governo eleito, citado na mensagem como ‘eventual governo do presidiário'."
Frustração com as Forças Armadas
"Na parte final do mês de dezembro de 2022, os áudios demonstram que Mario Fernandes estava frustrado com as Forças Armadas, que estariam aguardando uma decisão política para atuar. Em dado momento de mensagem encaminhada para o Coronel Reginaldo Vieira de Abreu, o general profere: ‘Cara, porra, o presidente tem que decidir e assinar esta merda, porra’. Na mensagem subsequente, Reginaldo Vieira de Abreu diz: ‘Kid Preto, cinco não querem, três querem muito e os outros, zona de conforto. É isso. Infelizmente’. Em sequência, lamenta o fato de a decisão do golpe por parte do Alto Comando depender de uma atuação colegiada unânime.”
Plano de sequestro e assassinato impresso no Planalto
A Polícia Federal aponta que o documento contendo o planejamento operacional denominado “Punhal verde amarelo” (que levaria à execução de Moraes, Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin) "foi impresso pelo investigado Mario Fernandes no Palácio do Planalto, no dia 09/11/2022, ocasião em que os aparelhos telefônicos dos investigados Rafael Martins de Oliveira (Joe) e Mauro Cesar Cid estavam conectados a ERBs (estação de telefonia celular) que cobrem o Palácio do Planalto, e posteriormente levado até o palácio do Alvorada, local de residência do presidente da República, Jair Bolsonaro. Assim, concluiu a autoridade policial que: 'Desta forma, conforme exposto, fica evidenciado que no dia 06/12/2022, no horário em que o Secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, general Mario Fernandes imprimiu o documento “Plj.docx” (18hs09min), possivelmente relacionado ao planejamento operacional da ação clandestina para prender/executar o ministro Alexandre de Moraes e assassinar o presidente e vice-presidente eleitos Lula e Geraldo Alckmin, o então presidente da República Jair Bolsonaro também estava no Palácio do Planalto. No mesmo período, verificou-se também a presença concomitante, na região do Palácio do Planalto, de Mauro Cid e Rafael de Oliveira."
https://notinciasemcensura.blogspot.com/2024/08/curiosidade-sobre-caso-do-et-de.html
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