O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) agiu para segurar a fila do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e frear a alta de gastos com benefícios previdenciários e assistenciais. Sob orientação da Casa Civil e do Ministério da Fazenda, o instituto usou o programa de enfrentamento à fila, que paga bônus aos servidores pela análise extra de requerimentos, para priorizar processos de revisão de benefícios ou apuração de irregularidades no segundo semestre de 2024.
Governo Lula, INSS e o represamento de benefícios: o que está por trás da “moderação enérgica”
No segundo semestre de 2024, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) passou por uma reviravolta em sua rotina de concessão de benefícios. Sob orientação direta da Casa Civil e do Ministério da Fazenda, o programa de combate à fila — cujo principal atrativo é o pagamento de bônus aos servidores que aceleram a análise de requerimentos — deixou de priorizar pedidos de aposentadoria, pensões, licença-maternidade e auxílio-doença para se concentrar, sobretudo, em revisões de benefícios já concedidos e na apuração de indícios de irregularidade.
Essa mudança passou por três fases principais:
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Início do represamento: em ofício de junho de 2024, o INSS determinou que, a partir de 1º de julho, as “filas extraordinárias” deveriam ser abastecidas apenas com tarefas de apuração de irregularidades no âmbito do MOB (Monitoramento Operacional de Benefícios).
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Reversão parcial: em 16 de julho, diante do aumento acelerado do estoque de pedidos (que já havia escalado de tendência de queda para cima de 2 milhões em dezembro de 2024), a orientação voltou a incluir pedidos iniciais de reconhecimento de direitos — ainda que sem retomar plenamente o ritmo anterior.
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Enrijecimento da moderação: em 13 de agosto, portaria conjunta da Casa Civil, da Previdência e da Gestão oficializou a prorrogação do programa, estabelecendo como prioridade as reavaliações de benefícios por incapacidade e revisões de ofício. A partir de setembro, atos sucessivos reforçaram que apenas revisões, apurações de irregularidade e reavaliações do BPC deveriam alimentar a fila extraordinária.
O efeito foi imediato no curto prazo:
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Estoque de pedidos: passou de cerca de 1,8 milhão em junho para 2,0 milhões em dezembro de 2024, e chegou a 2,6 milhões em maio de 2025.
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Tempo médio de concessão: que havia caído para 34 dias em julho de 2024 — abaixo do limite legal de 45 dias — subiu para 42 dias em dezembro e continuou a crescer no primeiro trimestre de 2025.
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Economia momentânea: cerca de R$ 2,4 bilhões foram poupados com as revisões, mas longe da expectativa de R$ 15 bilhões estimados pela equipe econômica para cumprir o congelamento de gastos.
Por que o governo fez isso?
Segundo interlocutores da Casa Civil e da Fazenda, a prioridade em revisões visava “desacelerar o avanço dos gastos no curto prazo”, num momento em que o governo precisava conter despesas livres para respeitar as regras fiscais. Em julho de 2024, havia a necessidade urgente de congelar R$ 15 bilhões em despesas, em grande parte pelo aumento dos gastos com Previdência e BPC decorrente da redução anterior das filas.
Em reunião entre julho e agosto de 2024, técnicos da Fazenda chegaram a afirmar que o prazo de concessão havia caído “demais”, ameaçando o equilíbrio orçamentário — e que era imprescindível “fazer uma gestão da fila” para compatibilizar prestação de serviço e disponibilidade de recursos.
Carlos Lupi, então ministro da Previdência, reconheceu ter recebido a orientação e afirmou que a medida causou intensa crise interna — entre técnicos do INSS, da Fazenda e da Casa Civil. “Quando é uma decisão governamental, a gente acata, ou sai [do governo]”, declarou em entrevistas.
O governo reage
Procurados pela reportagem, Planalto e Ministério da Previdência classificaram a tese de “represamento” como “absolutamente infundada” e “fantasiosa”. Em nota oficial, afirmaram que:
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Retroatividade: os benefícios, uma vez concedidos, são pagos retroativamente à data da solicitação, logo qualquer atraso não gera ganho fiscal definitivo, apenas um desembolso posterior com correção monetária.
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Desempenho: o tempo médio de espera caiu de 66 dias em janeiro de 2023 para 44 dias em maio de 2025 (dados que ignoram o período abaixo de 40 dias no segundo semestre de 2024).
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Fatores externos: atrasos na votação do Orçamento de 2025 e interrupção temporária do bônus em início de 2025 teriam prejudicado o combate mais intenso à fila.
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Combate à fraude: é obrigação contínua do INSS priorizar revisões e apuração de indícios de irregularidade, independentemente de restrições orçamentárias.
O Ministério do Planejamento, por sua vez, declarou que “eventual restrição orçamentária nunca foi critério definidor para o pagamento de benefícios concedidos no prazo regulamentar e que são obrigatórios por lei.”
Contexto histórico
Essa não foi a primeira vez que a fila do INSS sofreu “moderação”. No fim de 2022, no governo de Jair Bolsonaro, o instituto acelerou concessões para reduzir o estoque acumulado, mas enfrentou críticas do Ministério da Economia e precisou de crédito extraordinário autorizado pelo TCU para pagar a conta.
Sob Lula, porém, o ajuste foi mais sutil: em vez de simplesmente desacelerar todos os processos, optou-se por destinar o bônus apenas a servidores que fizessem revisões ou apurações, deslocando ao menos 150 novos servidores para essa função em setembro de 2024.
Impactos e desdobramentos
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Técnicos insatisfeitos: diversos servidores relataram desconforto, argumentando que a mudança feriu o propósito original do programa — agilizar a concessão de direitos.
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Aumento de pressão política: com a repercussão negativa do crescimento da fila, o governo retomou parcialmente o programa de bônus em 16 de abril de 2025, após a aprovação do Orçamento. Nesse mês, o estoque de processos apresentou a primeira queda desde junho de 2024.
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Riscos futuros: embora haja redução momentânea de gastos, o atraso na concessão acarreta pagamento de correções e juros, jogando parte da conta para exercícios subsequentes.
Reflexão final
A gestão da fila do INSS expõe o dilema central das finanças públicas: equilibrar a prestação rápida de direitos sociais com o rigor fiscal exigido pela legislação. A promessa de campanha de “eliminação das filas” esbarra nas limitações orçamentárias de um Estado que, ainda assim, precisa garantir atendimento ágil aos segurados.
Enquanto o governo nega ter “represado” benefícios, a série de ofícios, portarias e atos internos aponta para um esforço explícito de priorização de revisões em detrimento de concessões iniciais. Cabe agora ao Congresso e ao Judiciário — por meio de controle externo e fiscalização — definir até que ponto a eficiência operacional pode ceder lugar ao controle orçamentário, sem comprometer direitos legalmente constituídos.
Em última instância, a questão permanece: será possível, no Brasil, honrar a promessa de um INSS ágil e sólido, sem sacrificar a solidez das contas públicas? O debate segue aberto.
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